quinta-feira, 28 de junho de 2007

POR QUE APOIAMOS COTAS RACIAIS E SOCIAIS NA UFRGS?

Nair Iracema Silveira dos Santos e Rosane Neves da Silva (Professoras do Instituto de Psicologia)

Apoiamos o sistema de cotas, considerando o contexto e realidade da educação no Brasil, os dados estatísticos sobre perfil de estudantes que ingressam em nossa universidade e a história política e social do país, especialmente no que diz respeito à inserção da população negra neste contexto, que se expressa na profunda desigualdade social e exclusão racial, assumida e reconhecida em vários fóruns nacionais e internacionais. Na III reunião Mundial contra o Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerância Correlata, realizada em Durban, na África do Sul, em agosto de 2001, o governo brasileiro reconheceu a discriminação racial no país e assumiu compromisso de implantar ações afirmativas.

As políticas de ingresso na universidade pública brasileira têm priorizado a lógica meritocrática, justificando-se a necessidade desta como forma de seleção já que “não há vagas para todos”. No entanto, esta lógica se afirma como um processo natural, sem que se problematize por que esta forma e não outra, quando os dados nos mostram que ela é excludente e discriminatória, não cumprindo com os princípios de uma educação pública que, se não é possível para todos, que o seja para aqueles que não terão possibilidades de acesso ao ensino privado e para negros e índios, historicamente marginalizados na divisão social brasileira. É preciso considerar aqui a análise do professor José Jorge de Carvalho (2006) na discussão da proposta de cotas na UnB. Segundo o autor, não há equivalência entre exclusão social de brancos e exclusão social de negros, porque apesar de termos no país alguns momentos de mobilidade social, o mesmo não se pode dizer quanto à mobilidade racial, que tem sido “extremamente restrita” no Brasil. Assim não podemos afirmar que estudantes brancos e negros pobres estão em igualdade de condições na luta pela ascensão social, pois o problema social e a desvantagem do negro são causados também pela discriminação racial. Concordarmos com a afirmação de que a renda familiar no Brasil é um fator importante para definição de quem entra na universidade e, portanto, defendemos cotas raciais, além das sociais, considerando que entre estudantes pobres, os negros sofrem desvantagens por estarem nas faixas de pior distribuição de renda em relação aos estudantes brancos, que já contam com uma vantagem de escolaridade frente aos negros.


Consideramos também que a proposta de uma prova de “habilidades cognitivas” conforme defendem alguns colegas, não muda o processo atual do vestibular na UFRGS, pois o mérito continua sendo o primeiro critério. No sistema de cotas os estudantes negros e pobres farão as provas e serão avaliados. O mérito continuará sendo um critério, mas não o único e nem o primeiro. Além disso, estes estudantes ao ingressarem na universidade serão avaliados como os demais e terão que apresentar desempenho acadêmico. Possíveis defasagens de formação poderão ser compensadas por outras iniciativas na universidade, considerando que “habilidades cognitivas” se desenvolvem ao longo da vida acadêmica. Estudos já realizados com estudantes que ingressaram em universidades por sistema de cotas comprovam que o desempenho acadêmico destes é igual, ou até maior, em alguns casos, que outros estudantes ingressantes no sistema universal. Incluir mais uma prova para medir “habilidades”, que o próprio vestibular no sistema atual já mede, é negar a lógica excludente deste processo e não indica possibilidades de mudanças nas formas de inserção de estudantes negros e estudantes pobres no ensino superior.

Referências Bibliográficas:
CARVALHO, José Jorge de. Inclusão Étnica e Racial no Brasil: a questão das cotas no ensino superior. São Paulo: Attar, 2ª edição: 2006.

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