Regina Weber (professora do Departamento de História da UFRGS)
Ainda são possíveis outros argumentos a favor de ações afirmativas, tais como o são as cotas no ingresso do ensino universitário.
As cotas não terão a virtude de resolver e nem mesmo de minorar os problemas da pobreza do país. Elas são uma forma de tentar dissociar um determinado grupo étnico da imagem da miséria e outras mazelas de nossa sociedade.
Para o senso comum essa associação existe e não parece ter data para diluir-se; isto é, o senso comum brasileiro é racista e nem mesmo os casamentos interétnicos e sua prole mestiça têm acabado com isso. E porque permanece esse preconceito com os negros, se a escravidão que lhe deu origem já acabou há tanto tempo? Tomando o argumento de Wallerstein, alguém tem que fazer os trabalhos desqualificados mesmo na igualitária sociedade capitalista e democrática. Para viver integradamente em uma sociedade, alguns grupos tendem a adequar-se aos nichos profissionais que lhe são reservados.
O que as cotas podem favorecer é o surgimento de uma classe média negra, processo já em curso, de modo a tornar mais freqüente a imagem de negros em posições socialmente reconhecidas, autônomas. Isso teria efeito tanto sobre os próprios negros como sobre os outros. Nosso sistema econômico já produziu muitas crianças loiras faveladas, mas industriais negros praticamente não existem.
E porque esse grupo tem necessidade de um reforço institucional para isso, para esse combate de imagens? Uma razão é que a associação de um estamento inferior, causada por uma longa escravidão, a um traço fenotípico teve um efeito de longo prazo, certamente maior que as tranças que deveriam portar os chineses durante a dominação mandchu ou as tarjas do período nazista. A sociedade atual tem que se mostrar melhor que a do passado; há uma conta a ser paga e é preciso saldá-la. Enquanto as imagens negativas – extensas e amplas – de um determinado grupo étnico persistirem, um bônus social deve ser depositado, favorecendo esse mesmo grupo em sua luta contra as mesmas. A existência desta salvaguarda institucional, em si mesma, já um alerta de que a manutenção de uma confortável imagem de superioridade por parte dos brancos – obtida por herança – tem um tributo a pagar.
Regina Weber
Departamento de História/UFRGS
Ainda são possíveis outros argumentos a favor de ações afirmativas, tais como o são as cotas no ingresso do ensino universitário.
As cotas não terão a virtude de resolver e nem mesmo de minorar os problemas da pobreza do país. Elas são uma forma de tentar dissociar um determinado grupo étnico da imagem da miséria e outras mazelas de nossa sociedade.
Para o senso comum essa associação existe e não parece ter data para diluir-se; isto é, o senso comum brasileiro é racista e nem mesmo os casamentos interétnicos e sua prole mestiça têm acabado com isso. E porque permanece esse preconceito com os negros, se a escravidão que lhe deu origem já acabou há tanto tempo? Tomando o argumento de Wallerstein, alguém tem que fazer os trabalhos desqualificados mesmo na igualitária sociedade capitalista e democrática. Para viver integradamente em uma sociedade, alguns grupos tendem a adequar-se aos nichos profissionais que lhe são reservados.
O que as cotas podem favorecer é o surgimento de uma classe média negra, processo já em curso, de modo a tornar mais freqüente a imagem de negros em posições socialmente reconhecidas, autônomas. Isso teria efeito tanto sobre os próprios negros como sobre os outros. Nosso sistema econômico já produziu muitas crianças loiras faveladas, mas industriais negros praticamente não existem.
E porque esse grupo tem necessidade de um reforço institucional para isso, para esse combate de imagens? Uma razão é que a associação de um estamento inferior, causada por uma longa escravidão, a um traço fenotípico teve um efeito de longo prazo, certamente maior que as tranças que deveriam portar os chineses durante a dominação mandchu ou as tarjas do período nazista. A sociedade atual tem que se mostrar melhor que a do passado; há uma conta a ser paga e é preciso saldá-la. Enquanto as imagens negativas – extensas e amplas – de um determinado grupo étnico persistirem, um bônus social deve ser depositado, favorecendo esse mesmo grupo em sua luta contra as mesmas. A existência desta salvaguarda institucional, em si mesma, já um alerta de que a manutenção de uma confortável imagem de superioridade por parte dos brancos – obtida por herança – tem um tributo a pagar.
Regina Weber
Departamento de História/UFRGS
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